sábado, 21 de dezembro de 2013

Kindle

Sentir o papel passando pelos dedos e acompanhar o nosso marcador de textos avançar lentamente num livro grosso são alguns fetiches que só livros podem nos proporcionar. Ah, sem esquecer de que alguns livros também são ótimos em prateleiras de estantes. O ponto negativo seria que podem pesar muito e sempre há a chance de algo acontecer com nosso marcador numa hora inconveniente. Ou mesmo pode-se esquecer o livro em algum lugar ou emprestar a alguém que vai sumir com ele e nunca mais devolver.

Fico pensando como pude viver sem kindle durante tanto tempo. É fantástico poder carregar tantos livros e documentos na palma da mão de forma tão discreta que nem sinto medo em ser roubado. Afinal ninguém rouba livros, mesmo os digitalizados. Mal peguei o kindle e de repente já havia 80 livros nele. Numa leveza e conforto de leitura que nenhum livro de papel poderia me proporcionar.

Posso não substituir totalmente os livros de papel, afinal estantes precisam de sua beleza ainda, mas acho que a facilidade do kindle vai me colocar numa nova era de leitura. Portanto sugiro a qualquer pessoa que goste de ler que pegue um kindle e procure livros na internet sem medo de ser feliz.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Diário de um Velho Louco

Em mais uma exploração aos livros asiáticos encontrei essa narrativa simpática de um protagonista nada simpático. É mais uma história onde um homem velho, perto da morte e de virilidade já vencida que procura formas de se manter vivo, coisa que faz por meio de seu diário e por uma tara que o enlouquece por sua nora.

A narrativa de Junichiro Tanizaki se dá por meio do diário deste velho. Não sabemos que pessoa ele foi e ele não é muito dado a ficar lembrando do passado. Em grande parte somos levados a observar como a tara dele vai evoluindo enquanto toda sua moral se esvai. Não há vergonha alguma em seus atos e sua nora aprende a lidar com aquilo da forma que lhe beneficie.

O que é meio triste é como o velho protagonista consegue ser vazio e covarde em relação a sua própria situação e conforme sua volúpia avança, mais parece que ele odeia o mundo e pretende ofendê-lo como puder. Enfim, é um livro para se ler com sobrancelha franzida e alguma permissividade. Afinal ele é moribundo e precisa daquilo. Também descobrimos uma infinidade de remédios e substâncias que fazem parte do dia a dia deste velho em busca de alongar nem que seja alguns dias a sua pobre e desgraçada vida.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Kappa e o Levante Imaginário

Este livro de capa tenebrosa nos mostrar um pouco porque Ryonosuke Akutagawa dá nome a um prêmio literário no Japão. Justiça seja feita, ele merece. Essa seleção de contos nos dá a oportunidade de observar vários estilos de Akutagawa. Entre humor, drama, fantasia e horror, acredito que ele se destaque mais neste último. Ele possui um pessimismo bastante moderno.

Apesar de dar nome ao livro, Kappa não é um conto que envelheceu muito bem. O país dos kappas é usado para criticar o Japão da época por comparação. Alguma coisa ou outra ainda pode ser trazida ao nosso tempo como crítica interessante, mas no geral é uma fantasia fora de moda. Ainda que tenha um final que achei interessante e nos leva a uma pergunta que não está respondida no conto. Há também um pensamento lançado quando se fala sobre nascimentos: e se fosse possível perguntar a todos que vão nascer se eles querem ou não nascer? Como seria...

Mas já os contos Os Salteadores e o Inferno são cruéis e bonitos na mesma medida. Esses dois contos são os que mais se destacaram para mim por conseguir pintar um passado onde homens são levados a crueldade por tentação ou por talento. E por piores que sejam, ainda conseguimos sentir pena deles e sentimos raiva do mundo que os criou. Não há monstros, apenas homens capazes de tudo.

No livro ainda encontramos outros contos muito bons de Akutagawa que fazem este curto livro valer muito a pena ainda que fale tanto sobre a desgraça alheia. Pode não mostrar tudo que este autor é capaz, afinal não há nenhum romance aqui, apenas contos. Mas podemos ter uma boa ideia de sua qualidade.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Eu sou um Gato

Animal pensantes e falantes entre si. Acho que hoje seria o tipo de história que já nos deixa entediados antes mesmo de começar. Mas por ter sido escrita por Natsume Soseki no começo do século XX, damos algum crédito a mais e esperamos coisa boa de lá. Pena que dessa vez o autor me decepcionou. Este livro não é um romance como Kokoro e Botchan, ele é mais um somatório de opiniões pessoais do Soseki sobre vários aspectos da sociedade japonesa e do mundo acadêmico.

Seu personagem principal, o gato sem nome do professor, apenas fica de observador a família com a qual mora e um pouco da vizinhança. Ele começa com alguns comentários "gatescos", mas que em geral são usados para fazer críticas a sociedade mesmo. Seu dono é um professor bastante sem graça que só faz se sentir doente, ter raiva e reclamar da vida. Seu círculo de amizades envolve vários personagem com ares acadêmicos de segunda qualidade que conhecem muitos nomes, fazem muita pompa, mas aparentemente não sabem de nada. Alguns deles vão nos dar algo de cômico e real, pois são figuras que vemos ainda existir na comunidade acadêmica mesmo nos dias de hoje.

Mas toda a narrativa do livro é em função de nos levar a momentos onde Soseki dá suas opiniões sobre os casos. O que me faz sentir um pouco enganado pelo livro, mesmo que concorde com algumas opiniões expostas. Não é um mau livro, mas é bastante tedioso. Algumas situações se alongam demais e o final é bastante preguiçoso. Fiquei frustrado com a leitura e só aconselharia a sua leitura para quem gostar de tédio com raros momentos de efeito e quiser ter uma visão da sociedade japonesa da era Meiji em transformação. 

terça-feira, 23 de julho de 2013

The Rise of the Warlords

Contra a paz e o amor que reinava no mundo, Ghengis Khan, Alexandre, Napoleão, Júlio César e Átila, unem suas forças para devolver os culhões à humanidade. Enfrentando uma horda de inimigos que tentam pregar doutrinas de paz e amor, o grupo dos Warlords descobrirá que seus maiores inimigos são na realidade a economia e os jogos de influência política. Muito sangue hippie e lágrimas keynesianas serão derramados para que a guerra volte a fazer algum sentido num mundo de covardes. A paz é para os fracos.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Gosto do Barulho

Muita gente se entristece diante do momento político atual. Queriam algo mais focado. Que o protesto fosse capaz de dizer que atingiu tais e tais metas no final. É um desejo justo e sinceramente seria o ideal. Mas quando se tem tanta gente reclamando de coisas tão diversas, fica algo meio difícil de ser atingido. Mesmo que pelo menos os desejos iniciais de melhoria da qualidade dos serviços de transporte e baixa dos preços seja atingido, ainda ficaria um certo gosto amargo. Poderia ter sido mais...

Pessoalmente, não acredito que isso seja de todo ruim. O que mais gosto desse movimento todo é o barulho que promove. Quando trabalhei dentro de um Assembleia, tive oportunidade de assistir alguns protestos com uma indiferença que era natural do ambiente. O máximo que pensava era: vou sair pela rua de trás. Havia barulho, apitaço, panelaço, reclamações e no final entregavam alguma carta alguém que poderia ser lida ou não. Pouca gente acompanhava esse processo. Menos ainda via o desfecho. Sinceramente, acho que nem os manifestantes sabiam se eram ouvidos ou não.

O que dizer então de toda essa comoção nacional? Não acho que vá conseguir algo de imediato. Mas fez barulho. Gerou um ruído que muita gente ouviu. Não lembro de ter visto algo parecido por aqui; não por um motivo deste tipo. Então como não gostar desse ruído? Que façam muito barulho, o suficiente para deixar as "autoridades" com ouvido zunindo. Pelo menos esse mal podemos lhes causar. O resto só o tempo dirá. Para mim, só esse barulho já pagou tudo.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

A Casa das Belas Adormecidas

Até que ponto vai a solidão de um homem e as estranhezas dos japoneses? Este é um livro que tenta se aventurar por essas águas. O protagonista, o velho Eguchi, do alto de seus 67 anos, é convidado por um amigo a passar uma noite numa casa onde poderia se deitar com uma jovem adormecida de forma artificial. Inicialmente, pensei que a ideia era em torno do debate do estupro, mas não era bem o caso. Era uma casa para velhos afinal, muitos dos quais não possuíam mais essa vontade ou capacidade para tanto.

O que os levava até aquele lugar? O nosso protagonista fica se perguntando várias vezes sobre isso. Apenas com suas visitas consegue entender melhor aquele universo ao qual estava sendo apresentado. Naquelas mulheres adormecidas, Eguchi encontra seu passado e todas as mulheres que fez chorar. Talvez assombrado pelas lembranças dessas mulheres Eguchi se sente compelido a tentar manchar aquelas lembranças e destruí-las por meio da rebeldia contra as diversas regras do lugar. Naquela casa e naquelas mulheres ele encontra aparentemente todas as mulheres de sua vida.

Esta obra de Yasunari Kawabata é uma viagem por vezes sensual e por vezes fria à memória sentimental de um homem que conhece a proximidade de seu fim. De leitura rápida e sem muitas surpresas, somos levados a um certo asco contra Eguchi, mas talvez exista alguma surpresa cruel nesse asco. Será que todo homem pode chegar a ser como os clientes daquela casa? Suas tentações são cruéis, mas sua resistência também é ausente de qualquer glória. Por fim, é um bom livro apesar de mexer um pouco com nosso moralismo pessoal.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Dom Quixote - parte 2

Curioso o tempo que levei para ler esse livro. Já havia lido a primeira parte algumas vezes, mas por algum motivo sempre parava ali. Agora só o que penso é: Por que perdi todo esse tempo? Me arrependo, mas finalmente soube o que há por trás da segunda parte. O que encontrei foi um livro simplesmente fabuloso e estranhamente moderno. Tão moderno que faz parecer que o começo do século XVII é agora e que não mudamos nada. 

Nesta parte, de certa forma melhor do que no primeira parte, podemos trazer um pouco mais o Quixote para nossos tempos. Antes ele era um louco curioso buscando aventuras em qualquer lugar mesmo quando não houvesse alguma. Agora ele é apenas um homem velho que deseja viver o seu sonho da melhor forma possível. Muitos debocham e lhe pregam peças, mas dentro da visão dele, tudo faz parte de sua narrativa pessoal. Sua aventura segue intocada e dessa vez menos imaginativa devido as burlas que sofreu de quem sabia a sua fama de louco. Acho que talvez ai esteja o que mais me encantou nesta obra. Uma receita tão simples, mas apresentada de um modo tão perfeito por Cervantes que não há como não gostar dela.

Gosto bastante também de quando se fala de temas como liberdade, governo e sonhos. Não de um modo que nos retrata um outro período, mas sim de um modo que nos faz perceber que certas coisas fazem parte do ser humano e independente de épocas, sempre estarão presentes de uma forma ou de outra. Mesmo desejos populares ainda são semelhantes aos dias atuais. Penso que só no final me senti jogado de volta no tempo, pelo menos não de forma frustante.

Dentro dos livros de cavalaria este é talvez o mais humano de todos, ainda que possa ser considerado uma sátira e não propriamente um livro de cavalaria. Essa provavelmente foi a intenção de Cervantes. Criar um personagem ao mesmo tempo louco e discreto, que intrigasse a quem não o conhecesse e divertisse os demais. E claro que esse personagem não está só. Há quem o acompanhe e também nos ofereça momentos igualmente interessantes e divertidos: o escudeiro Sancho Pança. Enfim, é um livro que qualquer pessoa deveria ler em algum momento da vida, talvez até mais de uma vez. Há um universo de coisas nas duas partes do livro e as diversas impressões que pode nos passar o torna ainda mais atrativo. 

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Amanda

- Por que você não têm cabelos?

Por mais que ser estranho numa universidade seja algo bem aceito e até almejado, existem tópicos que não devem ser tocados. Ao fazer a singela pergunta, Apolinário tocava em alguns deles. Claramente, Amanda tinha um problema e seria sensível não apontar para ele. Pena que sensibilidade nunca havia sido um forte em Apolinário.

Sua pergunta lhe rendeu uma parceria para um trabalho em grupo. Este sempre foi um ponto fraco seu, pois poucos queriam trabalhar com ele e quase ninguém voltava a trabalhar após uma primeira vez. O trabalho foi satisfatório, mas a pergunta nunca foi respondida.

Amanda, no entanto, não se distanciou após o trabalho. Ela era do curso de economia, mas por algum motivo estava ali em biologia. Poucas pessoas deixaram Apolinário confuso como Amanda o deixava. Ela sorria e chorava com muita facilidade. Certa vez num dos momentos de choro, Apolinário perguntou se ela queria ver sua coleção de pelos de gatos imprimidos no solo após atropelamento.

Amanda odiava gatos. Achava injusto que tivessem 7 vidas enquanto ela tinha apenas uma e não muito boa. Geralmente quando reclamava de gatos estava reclamando de sua própria vida. De alguma forma acreditava que se fizesse muito isso, Deus a colocaria no corpo de um gato em sua próxima vida como castigo, mas esse era seu desejo. Ela aceitou na hora.

- Não é estranho que tudo termine em morte?
- Não.

O que aquilo tinha a ver com a coleção, pensava Apolinário. Amanda por vezes surgia com essas conversas. Para Apolinário ela tinha uma obsessão em achar estranheza em coisas naturais. Ela o beijou algumas vezes. Dizia que não se podia ter filhos por beijos. Mesmo assim Apolinário ficava mais tranquilo ao vê-la beijar outras pessoas no final de semana. Nem sempre eram homens, mas pelo menos quando o filho viesse, não poderiam dizer ao certo se era dele.

Apolinário nunca havia notado como sua cama era confortável. Ou talvez as outras pessoas não soubessem escolher camas. Amanda não deveria saber, pois vinha dormir na sua com muita frequência, às vezes durante o dia mesmo. Nessas horas Apolinário gostava se aproximar e observar a ausência de pelos em sua cabeça. Ele não entendia porque ela não a cobria. Parecia querer mostrar algo que não estava ali.

- Não é estranho que tudo termine em morte? – Voltava a perguntar por vezes.
- Não.

Amanda se foi numa terça-feira de carnaval. Sua pergunta nunca foi respondida. Ela lhe deixou um chumaço de cabelo de presente. Queria que Apolinário o colocasse em sua coleção. Pois talvez quando Deus se lembrasse de leva-la, talvez se confundisse e a tomasse por gato.

Apolinário

Apolinário. Nome de velho num corpo de criança. Provavelmente se referiam ao seu espírito. Desde os 7 anos gostava de ler autores russos e alemães. Aos 9, escolheu o Fausto de Goethe como obra para ler durante as férias. Chegou a começar a ler sua redação sobre o livro, mas a professora o pediu para interromper. Era um colégio católico, citar como homens se vendem por meros caprichos numa sala de crianças não parecia correto, embora a professora bem que necessitava de alguns caprichos.

Apolinário guardou a redação. O lia toda terça para seu gato que se chamava Gato. História peculiar tinha este nome, pois quando ganhou o bichano, seus pais lhe disseram para olhar para o gato e dizer o que mais se destacava nele. Apolinário simplesmente respondeu ‘gato’, não via nada que se destacasse mais que isso. Seus pais tentaram insistir um pouco mais para que o filho tivesse criatividade. Não deu muito certo. Apenas nomes como ‘focinho’, ‘bigodes’ ou ‘orelhas’, apareceram. Ficou o nome ‘Gato’ mesmo sendo uma fêmea.

Aos 12, após migrar para autores do oeste europeu, Apolinário tirou de um livro que queria ter a morte como esposa. Ficou pensando em formas de tornar isso possível. Casar-se com alguém e depois matar? Não parecia correto, pois se tornaria viúvo e não esposo da morte. Pensou em alguma senhora mais fácil. Má Sorte parecia uma boa opção, mas não se sentia particularmente atraído por ela. Vivia relativamente bem, mas sem luxos; tinha uma gata chamado Gato; tinha orelhas grandes e cabelos negros um pouco revoltados, mas que cediam facilmente ao controle da tesoura de barbeiro. Talvez não conhecesse a Má Sorte bem suficiente para entendê-la melhor. 

Tinha livros. Muitos livros. Seu pai não gostava de ler, muito menos sua mãe, mas para ambos parecia correto tê-los aos montes. Boa parte de sua infância foi ao lado deles. Gostava de pensar que eram parte de si, por mais antigos que fossem. Aos 14, fechou seu último livro e decidiu fazer amigos.

Apolinário não fazia ideia do que constituía amizade, mas achou por certo que tudo começava com conversa. Aproveitou a mudança de escolas para tentar puxar assunto com as pessoas de sua sala que ainda não sabiam de sua personalidade: 

- Hoje vi um gato morto. Estava estourado, pois os carros não se preocuparam em parar de passar por cima dele. 

Decerto esta não é uma das melhores coisas para se dizer em qualquer tipo de conversa. Mas é da natureza humana ser estranho aos 15. Mesmo que você já fosse estranho antes, as pessoas não notariam logo e outras até gostariam da estranheza. Assim Apolinário fez amigos e os desfez aos montes. 

A adolescência o deixou impulsivo. Boa parte do tempo decidia por impulso não fazer nada. Sentava-se com os atuais amigos e ficava simplesmente os ouvindo por uma tarde inteira. Isso por vezes durava alguns dias. Quando finalmente Apolinário respondia algo que fora conversado alguns dias antes. Não gostava de guardar opiniões e parecia ter por regra dá-las nos momentos mais inadequados. Seus professores não mais lhe faziam perguntas fora das provas. Pareciam temer o que poderia ser dito. 

Aos 16, viu sua já velha gata chamada Gato ser atropelada. Passou dias olhando o corpo do bicho imprimido no chão quase como uma tatuagem. Foi quando Apolinário decidiu estudar as ciências biológicas. Após sua fase de leituras, havia decidido que não havia nada dentro da alma humana ou de sua cabeça. Mas dentro do aglomerado de células que constituíam um corpo, parecia haver um universo de coisas a ser descoberto. Gostava da cor de sangue seco no asfalto. Chegou a fazer uma coleção de fotos disso que desapareceu um dia após sua mãe arrumar seu quarto. 

Aos 17 ganhou seu primeiro beijo. Achou que deveria tomar a responsabilidade, mas lhe parecia ser muito novo ainda para ser pai. Ficou mais aliviado quando a viu beijar outras duas pessoas na mesma noite. Não poderiam ter certeza que o filho seria dele. 

Ainda aos 17 entrou na universidade para estudar biologia. Seus pais ficaram aliviados por ele não ter decidido simplesmente ficar em casa após o ensino médio. De certa forma o temiam por algum motivo. Seria sua coleção de pelos de gatos atropelados? Ou talvez sua mania de construir coisas. Vez ou outra via um objeto interessante e logo decidia que precisava fazer um por mais simples que fosse. 

Chegou a fazer um abridor de latas genial. Pena que sua tia teve metade de seu indicador arrancado por ele ao tentar usá-lo. Apolinário não achava necessário jogar o abridor fora, afinal era inocente. Culpada fora a tia por não saber usá-lo. Apolinário tentou negociar o pedaço de dedo em troca de jogar fora seu abridor, mas antes que pudesse vencer o argumento, o pedaço já estava reimplantado. Aquela tia nunca mais os visitou. 

Aos 19, Apolinário conheceu Amanda.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Legend of Condor Heroes

Há quem ache que no oriente todos são iguais. Não dá pra dizer que todos estão absolutamente errados. Ao entrar em contato com esta obra, acho que meu maior desafio era perceber quem era quem. Eram tantos nomes, tantas técnicas. Parecia algum mangá japonês com muitos personagens que estavam ali só para constar. Até que em algum momento pegamos o ritmo. Ai aqueles personagens que eram X, Y e Z começam a ter caras e nomes. E por meio deles percebemos a evolução do personagem principal, Guo Jing.

Ele é um jovem meio estúpido porém de coração puro que cresce na Mongólia de Ghengis Khan, pois seus pais tiveram problemas com oficiais corruptos da dinastia Song. Guo Jing se envolve com a de muitos personagens reais da história chinesa, mas sem adulterar demais os fatos. O que já coloca esta obra num patamar de fan fiction histórico. Além de Guo Jing, conhecemos Huang Rong, uma bonita e inteligente jovem, que não tem uma boa noção dos padrões morais da época, ou melhor dizendo, era simplesmente mal educada.

Essa dupla vai sair por ai e se envolver em diversas aventuras numa China decadente enquanto desenvolvem seu kung fu e melhoram sua própria arte. É uma leve viagem de autoconhecimento com diversas surpresas e reviravoltas. Também há uma pitada de romance entre nossos dois protagonistas que enfrentam um pouco de tudo juntos.

É um livro leve e divertido. Nos mostra uma China bem moderna se pensarmos que no mesmo período na Europa haviam cruzadas e guerras menores. Até do ponto de vista da relação entre homens e mulheres há uma liberdade que nos deixa um pouco estranhos quando pensamos nos asiáticos de hoje. Enfim, vale a pena ser lido mesmo com um pouco de dificuldade na tradução em alguns momentos. Mas nada que ofenda demais a obra de Jin Yong.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Orlando Furioso

Fico em dúvida de como falar deste livro. Se por vários momentos é absolutamente fantástico, em outros me joga numa dúvida profunda do que está acontecendo. Parte em culpa da tradução que se esforçou ao máximo em manter a estrutura de rimas. O esforço é excelente, mas nem sempre efetivo. O que é interessante na edição é poder acompanhar a versão em italiano, que muitas vezes é capaz de explicar algumas situações mesmo quando seu italiano seja bem macarrônico.

Agora o que dizer de Orlando? Um livro sobre amor? De certa forma seria sim, mas em muitos momentos é de um amor tal que leva os homens à loucura. Orlando talvez seja a maior vítima. Só é curioso que amar uma mulher possa se confundir a amar sua virgindade. Uma vez que esta seja perdida... não há mais flores a serem colhidas naquele jardim. Mas ok, eram outros tempos e este é um machismo natural na sociedade ocidental. 

Orlando não é a única vítima dos encantos das donzelas. Muitos outros cavaleiros disputam suas respectivas amadas contra outros cavaleiros menos honrados. Existe uma guerra, mas ela passa quase despercebida. Sabemos que aparentemente há um cerco na França. Carlos Magno estava a arrancar as barbas enquanto seus melhores cavaleiros rodavam o mundo atrás de suas donzelas. O pobre imperador cristão andava sem sorte. Pelo menos Rinaldo consegue deixar sua obsessão por Angélica de lado e presta alguma ajuda ao imperador.

Acho que dos personagens, a que me pareceu mais interessante foi Bradamante. Uma mulher cavaleira desafiando todos os tipos de perigos enquanto corre atrás de seu amante que só faz ser capturado por magos e criaturas fantásticas. Além dela há que se destacar Orlando. Ele demora a aparecer, mas quando aparece sem dúvida é um dos melhores momentos do livro.

No mais, é um livro pra ser lido e relido. Acredito que a cada leitura podemos formar diferentes visões dos acontecimentos. Especialmente para pessoas que como eu têm dificuldade com poemas épicos. Agora seria um livro sobre amor? Ainda tenho minhas dúvidas. Talvez seja mais um livro sobre uma obsessão que se confunde com amor. E, claro, muitos encontros e desencontros.