quarta-feira, 19 de junho de 2013

Gosto do Barulho

Muita gente se entristece diante do momento político atual. Queriam algo mais focado. Que o protesto fosse capaz de dizer que atingiu tais e tais metas no final. É um desejo justo e sinceramente seria o ideal. Mas quando se tem tanta gente reclamando de coisas tão diversas, fica algo meio difícil de ser atingido. Mesmo que pelo menos os desejos iniciais de melhoria da qualidade dos serviços de transporte e baixa dos preços seja atingido, ainda ficaria um certo gosto amargo. Poderia ter sido mais...

Pessoalmente, não acredito que isso seja de todo ruim. O que mais gosto desse movimento todo é o barulho que promove. Quando trabalhei dentro de um Assembleia, tive oportunidade de assistir alguns protestos com uma indiferença que era natural do ambiente. O máximo que pensava era: vou sair pela rua de trás. Havia barulho, apitaço, panelaço, reclamações e no final entregavam alguma carta alguém que poderia ser lida ou não. Pouca gente acompanhava esse processo. Menos ainda via o desfecho. Sinceramente, acho que nem os manifestantes sabiam se eram ouvidos ou não.

O que dizer então de toda essa comoção nacional? Não acho que vá conseguir algo de imediato. Mas fez barulho. Gerou um ruído que muita gente ouviu. Não lembro de ter visto algo parecido por aqui; não por um motivo deste tipo. Então como não gostar desse ruído? Que façam muito barulho, o suficiente para deixar as "autoridades" com ouvido zunindo. Pelo menos esse mal podemos lhes causar. O resto só o tempo dirá. Para mim, só esse barulho já pagou tudo.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

A Casa das Belas Adormecidas

Até que ponto vai a solidão de um homem e as estranhezas dos japoneses? Este é um livro que tenta se aventurar por essas águas. O protagonista, o velho Eguchi, do alto de seus 67 anos, é convidado por um amigo a passar uma noite numa casa onde poderia se deitar com uma jovem adormecida de forma artificial. Inicialmente, pensei que a ideia era em torno do debate do estupro, mas não era bem o caso. Era uma casa para velhos afinal, muitos dos quais não possuíam mais essa vontade ou capacidade para tanto.

O que os levava até aquele lugar? O nosso protagonista fica se perguntando várias vezes sobre isso. Apenas com suas visitas consegue entender melhor aquele universo ao qual estava sendo apresentado. Naquelas mulheres adormecidas, Eguchi encontra seu passado e todas as mulheres que fez chorar. Talvez assombrado pelas lembranças dessas mulheres Eguchi se sente compelido a tentar manchar aquelas lembranças e destruí-las por meio da rebeldia contra as diversas regras do lugar. Naquela casa e naquelas mulheres ele encontra aparentemente todas as mulheres de sua vida.

Esta obra de Yasunari Kawabata é uma viagem por vezes sensual e por vezes fria à memória sentimental de um homem que conhece a proximidade de seu fim. De leitura rápida e sem muitas surpresas, somos levados a um certo asco contra Eguchi, mas talvez exista alguma surpresa cruel nesse asco. Será que todo homem pode chegar a ser como os clientes daquela casa? Suas tentações são cruéis, mas sua resistência também é ausente de qualquer glória. Por fim, é um bom livro apesar de mexer um pouco com nosso moralismo pessoal.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Dom Quixote - parte 2

Curioso o tempo que levei para ler esse livro. Já havia lido a primeira parte algumas vezes, mas por algum motivo sempre parava ali. Agora só o que penso é: Por que perdi todo esse tempo? Me arrependo, mas finalmente soube o que há por trás da segunda parte. O que encontrei foi um livro simplesmente fabuloso e estranhamente moderno. Tão moderno que faz parecer que o começo do século XVII é agora e que não mudamos nada. 

Nesta parte, de certa forma melhor do que no primeira parte, podemos trazer um pouco mais o Quixote para nossos tempos. Antes ele era um louco curioso buscando aventuras em qualquer lugar mesmo quando não houvesse alguma. Agora ele é apenas um homem velho que deseja viver o seu sonho da melhor forma possível. Muitos debocham e lhe pregam peças, mas dentro da visão dele, tudo faz parte de sua narrativa pessoal. Sua aventura segue intocada e dessa vez menos imaginativa devido as burlas que sofreu de quem sabia a sua fama de louco. Acho que talvez ai esteja o que mais me encantou nesta obra. Uma receita tão simples, mas apresentada de um modo tão perfeito por Cervantes que não há como não gostar dela.

Gosto bastante também de quando se fala de temas como liberdade, governo e sonhos. Não de um modo que nos retrata um outro período, mas sim de um modo que nos faz perceber que certas coisas fazem parte do ser humano e independente de épocas, sempre estarão presentes de uma forma ou de outra. Mesmo desejos populares ainda são semelhantes aos dias atuais. Penso que só no final me senti jogado de volta no tempo, pelo menos não de forma frustante.

Dentro dos livros de cavalaria este é talvez o mais humano de todos, ainda que possa ser considerado uma sátira e não propriamente um livro de cavalaria. Essa provavelmente foi a intenção de Cervantes. Criar um personagem ao mesmo tempo louco e discreto, que intrigasse a quem não o conhecesse e divertisse os demais. E claro que esse personagem não está só. Há quem o acompanhe e também nos ofereça momentos igualmente interessantes e divertidos: o escudeiro Sancho Pança. Enfim, é um livro que qualquer pessoa deveria ler em algum momento da vida, talvez até mais de uma vez. Há um universo de coisas nas duas partes do livro e as diversas impressões que pode nos passar o torna ainda mais atrativo.