Raimundo Silva tinha uma pacata vida de revisor literário até que num instante de impulso, ele comete um crime: ele troca um sim por um não. Na verdade não foi um simples sim que foi trocado pelo não. O sim que foi trocado mudaria por completo a História do Cerco de Lisboa. Ao contrário do que se esperaria num romance de Saramago, a história não muda. Os portugueses de fato tomaram Lisboa com o auxílio dos cruzados. A única diferença é que agora temos um revisor em situação delicada.
Mas é essa situação delicada que muda a vida de Raimundo Silva. A gráfica no intuito de evitar esse tipo de constrangimento novamente contrata a diretora de revisão Maria Sara. E, surpreendentemente, o já velho Raimundo Silva experimenta o amor dos jovens. Maria Sara experimenta o mesmo sentimento de Raimundo Silva, mas faz uma exigência: que Raimundo Silva escreva a história do cerco de Lisboa a partir daquele não.
Isso é curioso num autor de temas fantásticos e bastante pensativos. A história do cerco de Lisboa é relegada a um segundo plano, enquanto o que é de fato narrada é a história de Raimundo Silva e Maria Sara em paralelo a história de Mogueime e Ouroana, um soldado e uma escrava de guerra que representam os dois primeiros na história do cerco.
Um livro bem light para este autor exigente. Mas é o tipo de livro que pode ser um pouco cansativo para os que não conhecem Lisboa. Há descrições minuciosas que comparam a Lisboa do cerco com a Lisboa atual. Isso para nós que não conhecemos não significa nada. Mas para entender melhor o livro pensei no carnaval de Olinda, afinal é o que tenho mais próximo de uma guerra de cerco na minha mente. O povo de cima são os mouros. Que vem subindo as ladeiras são os portugueses. Muros de carne se formam evitando que uns desçam e que outros subam. Mas no fim todos sabem que os de baixo magicamente vão subir e dominar a Sé, cansados, sujos, suados e machucados. Agora é só esquecer que eles vão descer para não acabar numa contradição.
Mas viagens à parte. História do Cerco de Lisboa é um ótimo livro para se começar em Saramago. Não haverá fuga à lógica nem grandes moralismos ou dilemas. Infelizmente também não haverá muitas frases de efeito. Mesmo assim, vale uma tarde de segunda lendo.
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